Joao e Maria, caçadores de bruxa e um filme coreano


Por volta de 2013, na época de um princípio de renascimento intelectual do Brasil (que acabou frustrado), o meio direitista/olavista comentava muito sobre a ideia de uma educação do imaginário; houve um movimento de resgate dos contos de fadas que culminou na publicação do Fabuloso Livro Azul e demais livros coloridos. Foi nesse contexto que passei a dirigir um pouco mais de atenção sobre o tema.

Na certa você já deve ter lido algumas dessas histórias quando criança, muitas são mistificações de acontecimentos reais, outras frutos da criatividade dos contistas ou da tradição popular, outros ainda ecos longínquos de antigos mitos pagãos. Tais histórias tem o mérito de ser uma narrativa simples e divertida - própria para crianças - e ao mesmo tempo trabalhar arquétipos tradicionais e cristalizar certos arranjos simbólicos. Contudo, após a infância perdem muito de seu charme, embora possam ter seu simbolismo reciclado em narrativas um tanto quanto mais complexas. Foi o que o cinema tentou realizar nestas duas obras que comento aqui. Antes, uma pequena olhadinha no livro. 

O leitor sem dúvida conhece a história, mas talvez não tenha a lido no original. O grande diferencial da versão original com relação àquelas que tive contato na infância se dá pelo fato da iniciativa de abandonar as crianças na floresta partir da mãe. Não fora uma madrasta, mas a própria mãe quem traçou o plano e o marido banana (pai das crianças) cedeu por fraqueza. E isso não uma, mas duas vezes. Hoje em dia estamos acostumados com a ideia de pais desnaturados, mas alimentamos a ilusão de que antes as coisas eram melhores, parece que não...

Vamos ao primeiro filme: João e Maria -  Caçadores de Bruxas, este transforma o conto de fadas em algo mais gothic punk; agora crescidos João e Maria são famosos caçadores de bruxas. A atriz que interpreta Maria é linda e fica extremamente charmosa com aquelas vestes camponesas medievais, contudo a direção prefere fazê-la usar calças e enfeia-la com vestes masculinas... 


O filme parece se incomodar tanto quanto eu com a ideia de uma mãe abandonar os seus filhos na floresta, de forma que cria um plot para inocentar a mãe de João e Maria: na verdade ela seria uma bruxa branca (adepta da boa magia, como se algo assim existisse) que mandara às crianças a floresta para salva-las da perseguição de um populacho supersticioso. Apesar de linda, Maria é ali uma feminista chata, todo o filme está infestado de bobagem feminista de forma que os personagens masculinos são uns patetões inúteis. Não fosse o proselitismo woke o filme poderia ter sido maneiro, tem uma premissa com potencial, uma bela atriz, uma estética folk... tudo jogado fora.

O mesmo não se pode dizer da versão coreana (Henjel gwa Geuretel, 2007), que é realmente sombria. Devido a um acidente na estrada, um sujeito encontra abrigo em uma casa na floresta, onde habita uma linda família feliz. Talvez nem tão feliz assim, as coisas são meio estranhas e o sujeito nunca consegue deixar aquele lugar. Não se trata exatamente de João e Maria, se utiliza o simbolismo do conto de fadas para trabalhar uma outra história. História essa que trabalha temas bem pesados como o abuso infantil e parece ter um certo viés anticristão: os dois personagens cristãos da obra – um padre católico e um diácono protestante – são retratados da pior forma possível. 

No que diz respeito a estética, a obra coreana mesmo em um cenário contemporâneo consegue ser superior a ocidental (que tem a sua disposição todo o potencial folk de cenário medieval), a ambientação da casa, da floresta, as constantes e fracassadas tentativas de fuga do protagonista a rotina e o desvelar do mistério... Em geral prefiro assistir animes e não tenho muito contato com obras coreanas, mas esse filme demonstra bem como o nível artístico e narrativo dos mesmos.



Há uma terceira obra, também ocidental, que se propõe a trabalhar também os mesmos arquétipos desde o horror; o título Maria e João -  O Conto das Bruxas. Mas, sinceramente, não estou a fim de ver mais bobagem feminista.

Não indicaria nenhum dos filmes ao leitor desavisado, eles tem qualidades e tem defeitos. Além dos já citados, como todas as obras contemporâneas padecem do mal de abusar de cenas indecentes de sexo e nudez. E reitero que o segundo filme, ainda que tenha uma qualidade artística e narrativa superior, e não feche com a agenda feminista, tem em contrapartida um tom anti-cristão mais notável (não que o primeiro filme citado não o tenha, só é mais discreto nisso).

Voltando ao conto original, o principal de João e Maria é o arquétipo da bruxa, essas mulheres más  capazes de todo tipo de atrocidade até contra as mais inocentes crianças, arquétipo esse encarnado em tantas feministas, defensoras do assassinato de bebês, adeptas da prática da magia negra e em clara rebeldia aos desígnios do Criador. Essa história serve para inculcar já na mente das crianças a natural repulsa a esse tipo de figura. Procurava eu no cinema uma expressão live action disso, mas não encontrei, uma pena.

About Edmundo_Noir

Sommelier de anime, profeta do IApocalipse, missionário do chá e webteólogo. Pedalando entre ruínas.

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